23 de fevereiro de 2012

A Lei da ficha limpa

O Art. 15, inciso IV da Constituição veda a cassação de direitos políticos, cuja perda ou suspensão só se dará nos casos de: I - cancelamento da naturalização por sentença transitada em julgado; II - incapacidade civil absoluta; III - condenação criminal transitada em julgado, enquanto durarem seus efeitos; IV - recusa de cumprir obrigação a todos imposta ou prestação alternativa, nos termos do art. 5º inciso VIII, que veda a provação de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei; e, finalmente, V - improbidade administrativa, nos termos do Art. 37, § 4º da mesma Carta: Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível. Nossa Magna Carta prescreve, ainda, no Art. 54, o que deputados e senadores não poderão fazer e no Art. 55, os casos em que perderão o mandato.
 As leis complementares 64, 81 e 135 deram vida àqueles preceitos constitucionais, sendo que a LC 81 tem o único propósito de alterar o prazo de cassação dos direitos políticos originalmente de três para oito anos mais o período faltante para o término do mandato, aplicável, ainda, após trânsito em julgado.

A LC 135 abandona um dos princípios mais caros ao sistema romano-germânico de Direito, adotado desde sempre pelo Brasil: a presunção de inocência até que o processo transite em julgado na instância final.

Tanto o povo que iniciou essa lei, quanto o legislador que a desenvolveu no Congresso Nacional e o julgador que a declarou constitucional e aplicável a partir das eleições deste ano, por decisão do Supremo Tribunal Federal, concordam em que o preceito constitucional do Art. 14º, § 9º - de considerar a vida pregressa do candidato para proteger a probidade e moralidade no exercício do mandato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico e do abuso do poder de função ou cargo político-administrativo público - deve prevalecer sobre a presunção da inocência.

A partir deste momento histórico, um julgamento colegiado, implica em presunção de culpa e, portanto, submete o réu à aplicação da lei. Acaba aqui a infindável delonga dos sucessivos recursos, o mais das vezes chicaneiros, que demandam décadas para o término de um processo de político poderoso. Tal demora promove o esquecimento e o perdão pelo povo de pouca memória, facilita injunções políticas e, possivelmente, até financeiras nas decisões dos magistrados, a espera da prescrição por decurso de prazo.

O Congresso até que não esperou muito para elaborar a LC 64 de 1990 - apenas dois anos após a proclamação da Constituição - mas os efeitos da lei foram atenuados por uma sanção de apenas três anos de cerceamento dos direitos políticos e pela morosidade dos processos judiciais, quer pela enormidade de causas em julgamento, quer pelo desregrado exercício do direito à ampla defesa. O mau político logo voltava ás lides partidárias, pela estreiteza da sanção, ou nem as abandonava, por falta de julgamento final.

Foi esta lerdeza jurisdicional que provocou a revolta contra a corrupção, a iniciativa popular que culminou na promulgação da LC 135, e a infeliz decapitação da presunção da inocência. O ideal seria que novas leis aprimorassem e acelerassem a jurisdição, o que só agora e timidamente começa a ser feito.

Este é o momento em que se abre nova página na história política de nosso país. É o começo de passar a nação a limpo, o retorno á nunca existente plena moralidade no exercício da função pública. De agora em diante, por lei, passamos a exigir ilibada vida pregressa dos candidatos a cargos públicos. Velhos e novos carcomidos profissionais da política deverão olhar para si próprios e para as vidas que viveram e perguntar: estou apto a me candidatar a cargo eletivo? O que fiz de minha vida para merecer a confiança do povo?

Poucos passarão por esse teste reprovador. É hora de renovação.

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