14 de abril de 2019

ONDE ESTÁ O ERRO DO ENSINO BRASILEIRO?


PERGUNTA DE SEBASTIAO A BIANCA
Peço a ti, leitor, que de fato quer ver o Brasil progredir pela educação de alta qualidade, responda à pergunta no final destas observações:
1.      Diversos comentaristas consideram Paulo Freire um dos maiores educadores de todos os tempos;
2.     No período de 30 anos, 1985 a 2015, os professores brasileiros tiveram plena liberdade de cátedra e sem crítica;
3.     No mesmo período de 30 anos, as Universidades brasileiras gozaram de plena autonomia administrativa e educacional;
4.    A partir de 1992, o Brasil foi governado por políticos de esquerda, desde o centro-esquerda Itamar e o socialdemocrata Fernando Henrique, passando pelo socialista Lula até a comunista Dilma;
5.     Brasil investe 5,7% do PIB, um dos índices mais altos entre os 42 países da OCDE, a frente de Reino Unido, Canadá e Alemanha, sendo o 15º que mais investe em relação ao PIB;
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6.    Brasil está pessimamente colocado em 53º lugar no Pisa, entre 65 países;
7.     As universidades brasileiras estão entre as últimas classificadas no ranking mundial;
8.    O extenso analfabetismo funcional revela que a educação básica brasileira é muito deficiente;
9.    O enorme desemprego sistêmico, principalmente a imensa dificuldade do primeiro emprego, atesta que a educação brasileira em todos os níveis não prepara o cidadão para autonomia econômica;
ONDE ESTÁ O ERRO?

RESPOSTA DE BIANCA 12/04/2019
Para você, Sebastiao Imbiriba! Tardo, mas não falho.
Como muitos sabem, meu avô é um ser humano instigado! Uma pessoa com a qual, a despeito das divergências políticas, procuro manter um diálogo franco, aberto e fraternal. Não temos tido muito tempo para conversar, claro, em função da correria do dia a dia. Mas como a última polêmica, em particular, tinha relação direta com a nossa vida dentro da universidade, e como as universidades públicas tem sofridos muitos ataques no período recente (entre outros tantos que ainda estão por vir), julguei por bem fazer uma resposta mais cuidadosa, que compartilho publicamente com vocês (em parte dela, inclusive, conto com a ajuda do colega Allan Kenji). Escrevo para todos, esperando que outras vozes também venham se somar ao nosso debate.
A questão era basicamente a seguinte questão: por que as universidades públicas estão entre as últimas colocadas no ranking mundial das universidades, se gastamos tantos recursos com educação (aproximadamente 5,7% do PIB, próximo à média dos principais países da OCDE, acima de Reino Unido, Canadá e Alemanha)? A resposta segue abaixo:
1. Somos um país pobre em comparação com os demais (é só olhar os indicadores: PIB, PIB per capita, IDH etc.). Dizer que gastamos o mesmo em educação como percentual do PIB nada nos diz sobre o tamanho dos gastos em termos absolutos. Enquanto o PIB da Alemanha é de US$ 3,7 trilhões e o do Brasil é cerca de US$ 2,0 trilhões.
2. Somos um país com uma população gigantesca! Dizer que gastamos o mesmo em educação como percentual do PIB nada revela sobre o gasto por estudante. “São cerca de 6,6 milhões de estudantes no ensino básico alemão e 48 milhões no brasileiro, por exemplo. Por isso, o relatório da OCDE deixa claro que o Brasil está abaixo da média no valor investido por estudante. Enquanto a Alemanha está acima do que destina a maioria dos membros da OCDE, gastando cerca de US$ 10,8 mil por aluno/ano, o Brasil aparece com cerca de US$ 3,8 aluno/ano. A média da OCDE é US $ 9,4 mil”. (Fonte: https://politica.estadao.com.br/…/brasil-investe-porcentag…/). Gastamos pouco, portanto.
3. No caso das universidades brasileiras, os gastos se elevam substantivamente: “quase US$ 11,7 mil. [...] Com esse montante, o Brasil se aproxima de alguns países europeus, como Portugal, Estônia e Espanha, com despesas, respectivamente, por aluno universitário, de US$ 11,8 mil, US$ 12,3 mil e US$ 12,5 mil, e até ultrapassa países como a Itália (US$ 11,5 mil), República Checa (US$ 10,5 mil) ou Polônia (U$ 9,7 mil). A média nos países da OCDE é de US$ 16,1 mil, puxada por despesas mais elevadas de países como os Estados Unidos, Noruega, Luxemburgo e Reino Unido”. (Fonte: https://www.bbc.com/portuguese/brasil-41236052). E houve, de fato, um aumento nas verbas destinadas às Universidades entre os anos de 2003 e 2012 (que passaram de 10,3 bilhões para 25,9 bilhões). O erro, mais uma vez, está em não olhar os dados como um todo.
4. Ainda que a gente conviva diariamente com muuuuuuuitos problemas (de infraestrutura, condições de trabalho, condições de estudo, motivo pelo qual estivemos mobilizados durante todos esses anos), o aumento da verba de fato se converteu em uma expansão da estrutura física, aumento no número de vagas (em mais de 100%, passando de 109 mil para 231mil) e aumento do corpo docente (em 44%).
5. Além disso, as verbas destinadas às Universidades financiam não apenas atividades de ensino, mas também a pesquisa e a extensão (motivo pelo qual não podem ser comparadas com as verbas para os outros níveis de ensino). Sobre esse ponto, compartilho as palavras do colega Allan Kenji, que não poderiam ser mais apropriadas:
“As universidades têm por definição no Brasil: a) a indissociabilidade entre as atividades de ensino, pesquisa e extensão e b) a autonomia político-administrativa. Essa é a principal razão pela qual todas as tentativas de comparar o orçamento público destinado a essas instituições com outro nível de ensino são falaciosas, pois as universidades não se restringem apenas às atividades de ensino e custeiam diversos outros elementos como a pesquisa e a extensão, o que significa custear e investigar em infraestrutura pesada de pesquisa como laboratórios, equipamentos, insumos de pesquisas, mas também hospitais universitários, museus, e centros aglutinadores como observatórios astronômicos, centros de culturas vegetais e marinhas, bases avançadas de pesquisa e coleta de dados e até mesmo artefatos de altíssima densidade tecnológica como os aceleradores de partículas e os laboratórios de energia nuclear.
Aliás, os dados produzidos pelo próprio Ministério da Ciência e Tecnologia demonstram que as universidades respondem por praticamente toda a infraestrutura de pesquisa instalada no Brasil. Afinal, os capitais não fazem pesquisa e desenvolvimento em território nacional e as raras unidades de pesquisa e desenvolvimento estabelecidas em empresas como a Petrobrás e a Embraer resultam em grande parte de convênios e parcerias com centros de pesquisas e laboratórios das universidades públicas.
As universidades públicas são responsáveis por toda a pesquisa de base. Seja nas fronteiras do desenvolvimento do repertório interpretativo no campo da sociologia às novas fronteiras do conhecimento na física de partículas subatômicas, todo esse conhecimento só existe porque as universidades públicas ainda resistem”.
6. Por fim, o fato de não termos “subido” no ranking mundial (onde as instituições privadas de ensino sequer aparecem!), não significa que não houve melhorias em termos absolutos (como as mencionadas acima). Trata-se de um ranking: se todas melhoram, não pode haver uma mudança relativa de posição.
7. Por fim, concordando plenamente com Allan, creio que “A defesa dos recursos públicos para a educação pública, da creche à pós-graduação, portanto, não pode fazer oposição entre a educação básica e superior, mas formar uma unidade de todos aqueles que defendem irrestritamente a educação pública nacional”! Ou você está a favor da educação pública, ou está contra ela.


RÉPLICA DE SEBASTIAO 13/04/2019
Querida neta Bianca,
Tua resposta à minha provocação à moda de Sócrates, o grande perguntador, enche de orgulho este pobre velho já tão vaidoso dos netos (15) e bisnetos (9), primeiro, por vir de uma catedrática com extenso cabedal acadêmico, segundo por contribuir para um debate que provoco com objetivo de contribuir na busca de solução para o principal problema da Humanidade, neste século XXI, que é a ameaça do fim do trabalho.
Eu, humildemente, me considero um pensador, sem qualquer veleidade intelectual, mas interessado no bem da Humanidade e do povo brasileiro.
Vejo, a cada dia, em crescimento exponencial, a substituição do trabalho humano por robôs, primeiro, o trabalho braçal repetitivo no chão das fábricas, depois o de relacionamento pessoal no comércio e na comunicação, agora, o de lógica, pois que o computados processa logicamente muito mais rápido do que o ser humano, em breve só restará emprego para as tarefas que exigem inteligência intuitiva, característica quase exclusiva das mulheres, que a Inteligência Artificial (AI), possivelmente, ainda levará muito tempo para adquirir.
No fim, a AI aprenderá a desenvolver algoritmos de seu próprio desenvolvimento, ultrapassando e dispensando programadores humanos. Teremos então o fim do trabalho para o ser Humano. Suponho que isto acabe com uma das premissas fundamentais do marxismo.
Quando esta singularidade ocorrer, o desenvolvimento da máquina será explosivo e a AI dominará integralmente a Terra. Temos aqui a grande incógnita pós singularidade da AI quanto ao destino da Humanidade.
Enquanto esse fatídico dia não chega, teremos que resolver o dilema da escassez de renda, gerada pela falta de empregos, resultando em falta de demanda para a abundância de mercadorias geradas pelos robôs, ao mesmo tempo em que as instituições de ensino terão que fornecer mão de obra cada vez mais inteligente, mais culta e mais adaptável às mudanças, embora em muito menor quantidade. O Ensino terá que ser cada vez mais MERITOCRÁTICO e muito mais focado na excelência.
Tua resposta, querida neta, não responde à minha pergunta. Mas não estás sozinha, outros professores universitários, inclusive nosso amigo Paulo Lima, também não responderam. Aliás, alguns enveredaram pela desqualificação ofensiva e até me acusaram de imitador de Olavo de Carvalho.
Agora sabes que minha preocupação nunca foi a reles disputa política-ideológica de direita versus esquerda, mas de apreensão quanto ao destino da Humanidade, e considerando que o ensino nacional não atende às nossas reais necessidades, poderás buscar resposta à minha pergunta:
ONDE ESTÁ O ERRO DO ENSINO BRASILEIRO?


TRÉPLICA DE BIANCA
Bianca Imbiriba Obrigada, Vovô! 
Assim como no caso da primeira, acho que essa polêmica merecia uma segunda postagem! Kkkkk. Isso porque o tema me interessa bastante e porque acho que já se afasta um pouco dos problemas específicos da educação no Brasil.
Alguns comentários rápidos (depois tento desenvolver melhor):
1. Que o aumento das forças produtivas e desenvolvimento da tecnologia leve, no limite, ao fim do emprego (causando problemas especialmente para a parcela da população que vive de salário) não é algo que vai contra as premissas fundamentais do marxismo: é exatamente o que Marx aponta como tendência em O capital! Já disse isso a você: reconhecemos a mesma tendência, mas discordamos sobre a saída/solução.
2. Não acho que isso seja um problema da educação no Brasil. É um problema do capitalismo! Alguns países são mais bem sucedidos na administração do problema (garantindo que a população tenha o mínimo necessário para a sua subsistência). E fazem isso, veja bem, sem "deseducar" sua população (lembra o que Fernando dizia sobre a Dinamarca?! Escola e universidade pública para todos. Qualquer um pode entrar, sem nem fazer processo seletivo! Enem, pra ele, era um negócio sem sentido.).
3. Não acho mesmo que a saída seja caminhar para um tipo de educação meritocrática, exclusiva, para umas poucas cabeças pensantes, simplesmente porque não vai ter emprego pra todo mundo. Vamos educar, formar e dar cultura para a nossa população, sim. Sonhamos com um dia em que as pessoas não estarão mais preocupadas com ter ou não ter emprego, certo? Quando esse dia chegar, elas precisarão estar bem formadas e informadas para fazer o que quiserem das suas vidas.
Beijos. Te amo 


QUADRÚPLICA DE SEBASTIAO
Querida neta Bianca,
Concordo com muito do que dizes em tua última postagem:
1.      Afirmas, corretamente, que Marx previu a eliminação de empregos pela mecanização industrial.
a.     Em meu entendimento, a eliminação tecnológica do emprego, que também podemos dizer libertação do Homem do trabalho, retira do ser humano um elemento que Marx considera essencial ao Homem, algo que o caracteriza, o trabalho;
2.     Até a ocorrência da singularidade da AI, decorrerá algumas décadas de crescente desemprego, que dizes ser problema do Capitalismo e não do ensino brasileiro, com o que até concordo;
a.     No entanto, livre iniciativa e direito à propriedade de bens de produção sempre estiveram presentes em nossa sociedade e são garantidos pela Constituição, e não me parece politicamente realista esperar mudanças democráticas em curto prazo, o que nos obriga a resolver o problema do desemprego crescente;
b.    Então, sou obrigado a citar o caso emblemático de Singapura que, a partir de 1957 adotou a postura de abertura ao capitalismo e preparou seu povo, através de primorosa educação, a prestar excelentes serviços a todas as empresas que lá buscam facilidades e benefícios que lhes aumente a produtividade, resultando em pleno emprego, prosperidade, bem-estar e satisfação geral da população, que inluem esta pequena nação entre os mais bem colocados em renda per capita e desenvolvimento humano;
3.     Sou totalmente a favor da educação superior de caráter humanista para toda nossa população, desde a mais tenra idade;
a.     Por outro lado, aqui mesmo no Brasil, temos exemplo de educação e pesquisa, numa perfeita sintonia entre o centro gerador de cultura, a Embrapa, e o usuário do conhecimento ali gerado, o agronegócio, que trouxe nosso país ao mais alto nível de competitividade entre os grandes produtores de alimentos para a Humanidade.
b.    Assim, acredito que, diante da realidade dos recursos escassos, comum em todas as economias, deveríamos estabelecer um sistema meritocrático de ensino, desde a pré-escola até o doutorado, acoplado à pesquisa cientifica-tecnológica nos campos onde o Brasil possui vantagens competitivas, preparando nosso país para ameaças as mais diversas, inclusive os pesados investimentos chineses no agronegócio africano oriental, cuja menor distancia da China nos criará desvantagem nos fretes;
c.     Devo, ainda, citar o exemplo do futebol, cujos milhares de olheiros estão sempre atentos ao surgimento de novos talentos infantis a serem imediatamente recrutados para uma vida de educação e preparação de altíssima qualidade que lhes realcem a genialidade e contribua para a vitória de seus times, num sistema absolutamente meritório e recompensador do talento;
4.    O Brasil precisa desesperadamente de enriquecer, e muito rapidamente, para implantar uma Renda Mínima Universal, algo como o imposto de renda negativo proposto por Milton Friedman, e defendido no Brasil por Suplicy, de modo a que, os que não tenham e mesmo os que não queiram emprego, tenham como viver com o mesmo bem-estar e padrão de vida de um aposentado escandinavo.
Se estiveres interessada, lê minhas propostas a este respeito em: http://imbiriba.blogspot.com/search?q=renda+m%C3%ADnima

PRECISAMOS DE EDUCAÇÃO DE ALTA QUALIDADE!
Beijos, querida neta. Obrigado pela atenção que dás a este velho ignorante.
Te amo. Deus te abençoe.