27 de novembro de 2014

Renda Mínima Incondicional e Universal

Refletindo a respeito do que se tem falado e escrito sobre a eliminação da miséria, redução da pobreza e diminuição da desigualdade de renda entre classes sociais, bem como os métodos propostos para solução destes graves problemas, entre os quais diversos programas assistenciais, seguros e impostos de renda negativos chego à conclusão de que há absoluta necessidade de instituição de Renda Mínima Incondicional e Universal.
Antes de entrar no mérito da renda mínima, cabem duas perguntas:
1.   Deve o Estado prover alguma coisa a todos os cidadãos sem cobrança direta?
2.   A quem compete o dever de socorrer um recém-nascido abandonado cujos pais e parentes hajam falecido?
Para o primeiro caso, basta dar exemplos muito simples: as cidades oferecem a todos os que queiram utilizá-las ruas, avenidas e parques; o Estado se encarrega da Segurança Nacional, realizada pelas Forças Armadas, e da Segurança Pública, proporcionada pela Polícia. Estas despesas são cobertas por tributos gerais sem vinculação direta com os serviços prestados que são gerais e gratuitos.
No caso do bebê, estou certo de que haverá quem o queira socorrer e criar. Mas, certamente, cabe ao Estado regulamentar, promover e apoiar a adoção. Se assim é, o Estado deveria ajudar financeiramente os pais adotivos. O mesmo se aplica a outros inválidos desassistidos e carentes.
O pensamento liberal pode desejar o Estado mínimo, mas não pode dispensar o Estado ou, pelo menos, suas funções essenciais, principalmente a Justiça e as Leis que permitam o funcionamento desta. Concluímos, portanto, que o Estado deve existir e deve prover serviços essenciais, inclusive a assistência econômica mínima para garantir subsistência e dignidade aos desvalidos.
Quando falamos em dar dinheiro a pobres, nos vem à lembrança a ideia de incentivo ao descanso, mas não podemos esquecer que os pobres são os menos instruídos e que o maior convite à inércia é o desconhecimento das oportunidades, benefícios e orgulho do trabalho qualificado. Desta forma, nenhum programa de erradicação da pobreza frutificará sem apoio intenso da educação para o trabalho e o empreendimento.
Agora, não cabe ao Estado julgar caso a caso quem merece a assistência financeira. Isto implicaria em extensa burocracia e, certamente, em corrupção. Não importa se o indivíduo tem ou não necessidade do subsídio. Todos terão direito a recebê-lo. Se a Lei deve ser universalmente aplicável, então, esse tipo de assistência será também universal.
A Renda Mínima (RM) atende ao dever do Estado de atender necessidades econômicas mínimas à dignidade humana e será o valor pago, incondicional e universalmente a todo e qualquer indivíduo desde a gestação até a morte.
Esse valor deve ser suficiente para o custeio, sem necessidade de quaisquer outros subsídios, das funções – nutrição, proteção e reprodução – e necessidades básicas de vida decente e digna do indivíduo - educação, alimentação, vestuário, moradia, transporte, higiene, saúde e aposentadoria ou seguros correspondentes.
A renda mínima deve ser estabelecida pela média das necessidades básicas de toda a população. Também deve ter valor único, ser incondicional e universal para evitar a burocracia e a corrupção induzidas pelo estudo de casos individuais.
A renda mínima substitui e elimina os gastos de execução de todos os demais programas sociais fornecidos pelo Estado.
Como dito acima, o cálculo da RM deve incluir prêmios de seguros essenciais, de tal forma que desemprego, aposentadoria, despesas de saúde e outros não mais serão encargos do Estado e passarão a ser responsabilidade do indivíduo devidamente garantido por seguradora de sua própria escolha. É claro que as seguradoras devem ser garantidas elas próprias por resseguros e o sistema securitário adequadamente regulado. Dormimos mais tranquilamente quando sabemos que guardas-noturnos velam por nosso sono; assim, confiaremos melhor no mercado securitário se este for adequadamente vigiado.
O valor da RM será estabelecido em levantamento censitário das despesas médias dos indivíduos de uma família padrão - dois adultos e duas crianças – de modo a permitir a correta adequação do orçamento familiar.
No entanto, a RM deve ser mantida em nível intermediário, entre o imediatamente superior ao da pobreza extrema e o imediatamente inferior à renda de uma família padrão sustentada por dois adultos, cada qual recebendo um Salário Mínimo (SM) vigente no momento do início da transição entre os regimes atuais e o da plena vigência da RM.
Desta forma, a renda mínima de cada membro da família padrão será inferior a um quarto daquele salário mínimo. É muito provável que o aluguel ou prestação de compra de casa rateada por duas ou mais pessoas será menor do que por apenas uma. O mesmo se aplica à alimentação, energia, e outras facilidades quando compartidas. Desta forma, a vida econômica do indivíduo solteiro será mais dispendiosa, promovendo a agregação familiar.
Ao mesmo tempo, tanto a renda individual quanto a familiar estarão em tal nível que, embora atendam as necessidades mínimas, ainda requeiram renda adicional para conforto e autoestima.
O objetivo é que a renda mínima ampare os que não possam trabalhar devido a desemprego, incapacidade, idade menor ou velhice, doença, deficiência ou compromissos com cuidados a filhos pequenos, ao mesmo tempo em que sirva de estímulo à busca de aumento da renda pelo trabalho.
Os sistemas que retiram o subsídio quando o indivíduo obtém renda própria é contraproducente e desestimulador. A renda mínima será permanente e qualquer renda proveniente do trabalho se adiciona a ela, melhorando o padrão de vida do trabalhador, incentivando constante qualificação, reciclagem e aperfeiçoamento.
O custeio do programa de RM será realizado pelos seguintes meios:
•         Eliminação de todas as despesas de cunho assistencial do Estado;
•         Eliminação de todos os tributos incidentes sobre trabalho e salário substituídos pela aplicação de dois tributos complementares sobre: faturamento bruto e renda ou lucro líquidos.
Em prazo previamente estabelecido, o mais curto que seja possível, o salário mínimo será eliminado. O valor do trabalho será estabelecido por acordo entre empregado e empregador, sem adicionais de qualquer espécie obrigatório por lei, de modo a manter a empresa competitiva.
Após um período de transição, todos os serviços sociais custeados pelo Estado serão descontinuados e a economia decorrente transferida para cobrir as despesas da RM. Entre os serviços a serem interrompidos contam-se, por exemplo: aposentadoria, defensoria pública, seguro-desemprego, medicina e educação.
O Estado será liberado de todas as atribuições que não lhe sejam intrínsecas, restringidas a: Defesa Nacional, Diplomacia, Justiça, Fisco, Polícia, Saúde Pública, Regulação do mercado e os serviços essenciais ao funcionamento dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário.
A propósito, embora esta não seja a preocupação central destas reflexões, os funcionários de Estado - por exemplo: juízes, militares e auditores - serão concursados, admitidos e remunerados em carreiras de Estado uniformes e remuneradas em níveis compatíveis do mercado. Os funcionários auxiliares dessas funções de Estado – por exemplo: secretários, escriturários e porteiros – serão contratados, admitidos e remunerados conforme a média das regras, funções e valores semelhantes no mercado, visando sempre à agilidade, qualidade e continuidade dos serviços. De qualquer forma, o funcionário público não disporá, às custas do Estado, de serviços tais como assistência médica, aposentadoria e outros, devendo neste aspecto igualar-se aos demais cidadãos.
Uma vez que o salário mínimo seja abolido, as instituições empregadoras do mercado estarão livres para acordar com seus empregados as respectivas remunerações. Qualquer benefício adicional à RM proveniente de remuneração do trabalho dependerá da política de Recursos Humanos refletiva da visão estratégica de cada empresa. Evidentemente, as mais criativas e inovadoras oferecerão os maiores atrativos.
O trabalho de alta qualidade e desempenho sempre foi e sempre será bem avaliado e bem pago, como é o caso de artistas, desportistas e executivos realmente talentosos.
O mercado encontrará o nível “normal” de remuneração de cada competência: não poderá ser ínfimo por não atrair a quem tenha renda mínima sem qualquer esforço; não será exorbitante pela pressão sobre lucratividade e competitividade; mas tenderá a ser o suficientemente grande para atrair talento, competência e capacidade de apresentar resultados.
Sendo o valor do trabalho estabelecido dessa forma, mesmo o trabalhador menos qualificado poderá encontrar colocação, tornando o pleno emprego próximo de ser atingido.
Os efeitos da criação e universalização da RM, extinção dos encargos assistenciais do Estado e eliminação do SM seriam importantes no funcionamento do Estado, na economia e na vida dos cidadãos pelos seguintes motivos:
1.           Eliminaria a miséria e a pobreza extrema;
2.           Diminuiria a disparidade de renda;
3.           Ampliaria o mercado consumidor de produtos e serviços básicos na faixa mais inferior da pirâmide econômica, alavancando toda a economia;
4.           Quanto melhor qualificado e mais valioso o trabalho, maior o salário acordado entre empregado e empregador;
5.           O trabalhador sem qualificação ainda encontraria oportunidade de emprego e acréscimo de sua renda mínima. Por outro lado, uma vez que as necessidades básicas estarão atendidas, por mais ínfimo que seja o salário terá que ser suficientemente atrativo para demover o trabalhador desqualificado da inércia.
Em curto tempo de adaptação o livre mercado, minimamente regulamentado, resolverá os problemas de oferta e prestação correta e barata de serviços tais como educação e saúde, permitindo a livre escolha pelos usuários entre diversos concorrentes.
É possível que, em localidades pequenas e remotas, não haja atrativos para os fornecedores desses serviços. Tais casos devem merecer tratamento especial e específico, sem prejuízo de um programa que deve ser universal, incondicional e desburocratizado. O terceiro setor deve ser estimulado, mas não financiado, pelo Estado a atender essas necessidades excepcionais.
Ainda, o indivíduo não educado ou inconsequente pode não saber distribuir corretamente sua renda entre despesa supérflua e investimento no futuro, desprezando a contratação de seguros de saúde, emprego e aposentadoria, ou de formar poupança para momentos de maior dispêndio e emergências.
Nestes casos, a sociedade deverá decidir se aposta na educação e no discernimento de cada um, amparada na nomeação de tutores para os menores e incapazes, ou se mantém instrumentos assistenciais, reguladores e controladores com a consequente burocratização, altos custos e corrupção.
O programa de renda mínima deve ser antecedido e acompanhado por extensa e intensa campanha educativa sobre responsabilidade financeira e administração do orçamento familiar. O indivíduo deve ser livre para gastar seu dinheiro como desejar, mas absolutamente responsável pelos atos que cometer.
Não cabe ao Estado ser tutor de cada indivíduo, o que conduz ao controle e cerceamento da liberdade. Cada indivíduo deve ser responsável por conduzir sua própria vida, com discernimento, dignidade e liberdade. Afinal, cada pessoa deve ter livre arbítrio e responsabilidade sobre seus atos.
A grande maioria da população sabe se conduzir corretamente, aprende a usar cartão de débito e crédito, Internet e telefone móvel, e usa tais instrumentos em sua vida rotineira, assimila a cultura da responsabilidade pelas próprias atitudes e discernimento financeiro, coisas que pode aprender aprende no lar, na escola e na mídia. Portanto, nada impede que o sistema de renda mínima funcione bem e cada vez melhor.
Os programas sociais, entre os quais se incluem saúde, educação e aposentadoria, são os maiores sorvedouros de recursos do Estado que, para atendê-los, monta estruturas burocráticas monstruosas, caras e corruptas. Liberar o Estado desses encargos o tornaria mais dinâmico, mais eficaz e mais benéfico.
A iniciativa privada, com certeza, é capaz de produzir mais e melhor, proporcionando maior satisfação ao cidadão consumidor.
A renda mínima, associada à eliminação dos entraves burocráticos, encargos e despesas para-salariais das empresas e assistenciais do Estado permitirá o funcionamento de uma sociedade menos sobrecarregada de impostos, mais responsável, mais produtiva, mais equânime, mais afluente e mais feliz.
Cabe à sociedade decidir se pretende que o Estado nos mantenha, a todos, escravos dos políticos no poder ou se acredita na autonomia e na dignidade do indivíduo.