29 de setembro de 2018

Políticas de Fé ou Ceticismo

O filósofo da História, Michael Oakeshott, nos ensina que o seguidor da Política de Fé está convicto de que o sistema político-econômico no qual acredita seja o ideal perfeito para as nações e deve ser implantado mesmo sem assentimento de seus povos e, para evitar reação, imposto de modo imediato e geral.
Se o resultado dessa política é satisfatório, a população se conforma, aceita e até apoia, mas como não há sensação de pertencimento por parte dos operadores a produção de benefícios é restrita e lenta. Exemplo importante disto são os sistemas universais de saúde gratuitos, existentes em vários países, que prestam bons serviços, embora aquém de hospitais particulares de primeira linha, e mesmo de planos de saúde pagos por empregadores.
Por outro lado, se o projeto fracassa, os resultados muitas vezes são terrivelmente desastrosos. Exemplo de tal falha foi o Grande Salto para Frente, de Mao Tsé-tung, que visava desenvolvimento igualitário e rápido, mas que gerou a Grande Fome e mortandade de dezenas de milhões de chineses. Tragédia semelhante fora produzida décadas antes por Stalin na União Soviética, mas não serviria de lição a quem depositava inabalável fé em sua própria verdade. E assistimos algo semelhante agora na Venezuela.
Já os proponentes da Política de Ceticismo tendem a manter o status quo, embora aceitem que algum particular possa experimentar aperfeiçoamentos por conta própria e dentro de seus limites.
Quando tais projetos fracassam, os prejuízos ficam circunscritos aos limites originais, cessam de imediato e, geralmente, podem ser reparados porque raramente causam mortandade humana. O exemplo de maior repercussão foi o desastre de Bhopal, em 1984, quando a fábrica da Union Carbide na Índia vazou gases tóxicos que mataram dez mil pessoas.
Se há sucesso, no entanto, este se propaga rapidamente pelos motores da imitação e da emulação inerentes ao ser humano e, em muitos casos, beneficiam toda a Humanidade.
Podemos citar alguns exemplos:
· Agricultores japoneses plantaram juta na Amazônia e logo foram imitados por quase todos os ribeirinhos do Baixo Amazonas, os quais viram suas rendas aumentadas enquanto essa fibra vegetal não sofreu concorrência das sintéticas;
· Henry Ford introduziu a produção seriada em massa de automóveis e teve seus métodos copiados por quase todas as demais indústrias, multiplicando a eficiência da produção de bens de todos os tipos, cada vez melhores e mais baratos;
· Bill Gates, em sua garagem, produziu o sistema operacional para microcomputadores que disparou a criação do Mundo informatizado que temos hoje;
· Em 1969, dois elos da ARPANET foram criados em duas universidades da Califórnia, dando origem à Internet e à Sociedade do Conhecimento e da Informação que temos hoje em franca expansão;
· Durante a Segunda Grande Guerra, o vice-presidente dos Estados Unidos, Henry Wallace, executando a Política de Boa Vizinhança na América Latina, solicitou à Fundação Rockfeller que coordenasse e financiasse uma pesquisa científica orientada à eliminação da fome no México. O agrônomo e geneticista Norman Borlaug participou desse projeto, criando um cultivar de trigo semianão - pelo qual recebeu o Prêmio Nobel - que ajudou a eliminar a fome no Mundo. Projeto semelhante foi posteriormente realizado nas Filipinas, com cultivares de arroz, completando o trabalho de eliminação da fome iniciado por Borlaug.
Nenhum destes casos foi implantado de modo amplo nem impositivo. Todos evoluíram a partir de ambientes restritos e em processos de lenta consolidação até que, tendo eficácia provada, espalharam, rapidamente e por toda parte, benefício generalizado.
Podemos concluir que a mera proposição de Política de Fé empurra a sociedade para o aperfeiçoamento, mas sua aplicação real, muitas vezes, provoca desastres humanitários e, por outro lado, que a simples pregação de Política de Ceticismo é inerte, mas sua implementação geralmente produz prosperidade e bem-estar.