Este não é o primeiro e não será o
último dos escândalos envolvendo políticos renomados pela bravura com que se
batem pela ética e contra a corrupção. O Senador Demóstenes é apenas mais um de
enorme lista. E olhe que suas malfeitorias nem são tão graves assim, como as de
outros melhor aquinoados. Convenhamos, desde quando parece estranho ver um
delegado, ou ex, envolvido com contraventores do jogo do bicho e da jogatina em
geral no mundo todo? Faz parte da crônica policial e é relatada em todos os
jornais, todos os dias, em toda parte. E coisas normais são desculpáveis, plenamente
aceitáveis. Afinal, ninguém pode consertar o mundo. Nada de mais. Como disse Lula,
é apenas caixa dois.
É apenas caixa dois... Triste caixa
dois, infame caixa dois, desgraçado caixa dois que arruína o cerne da política
e destrói os últimos resquícios de moral no caráter dos políticos.
Todo político, todos eles, precisam
de dinheiro para financiar eleições e, mesmo quando o têm em abundância, como
alguns milionários, sempre recorrem aos amigos, quaisquer que sejam, buscando
contribuições. Alguns políticos, dos que hoje estão nos píncaros do poder
nacional, inclusive na própria presidência, acham, ou assim lhes parecia,
plenamente justificável assaltar bancos e sequestrar ricaços para financiar
ativismo político, propaganda e terrorismo. Tudo, é claro, em favor da
democracia, do povo sofrido, da soberania nacional e contra a burguesia
retrógrada e o imperialismo esmagador.
Então, quando a necessidade aparece,
não custa nada receber ajuda de quem está sempre pronto a contribuir em troca
de algum favor ou proteção. É normal. Como disse o Lula, é apenas caixa dois.
Nada de mais.
O que fez o Demóstenes? Andou por
algumas repartições verificando onde poderia ajudar ou proteger um querido amigo
que lhe fizera inesquecível presente de casamento, um querido amigo que não é
nem criminoso, senão apenas um simples contraventor, desses que simpaticamente
financiam nossa alegria no carnaval, no país todo. Enquanto não trabalhava por
Cachoeira, seu querido amigo, Demóstenes verberava contundentemente contra
ministros nomeados por Lula para o governo Dilma, ministros dominós que caem um
após o outro numa sequência vergonhosa de tiro ao alvo disparado por essa mídia
lesa majestade que é contra tudo e contra todos e não poupa nem os coitadinhos
dos ministros malfeitores.
Até parece que Demóstenes era o mais
virtuosos dos santos, o menos pecador dos mortais, exemplo de varão bíblico,
homem reto, corajoso e digno. Era tanta, tanta dignidade que transbordava pelo
senado e se espraiava pelo cenário nacional a receber admiração e aplauso. Até
que terríveis revelações, obtidas não se sabe como, nem por quais artifícios,
de sindicâncias policiais que de repente se tornam públicas, entornam baldes de
água fria sobre a resplandecente imagem do ilustre senador, o virtuoso. A luz
se apaga, fenece, extingue.
Agora temos novo escândalo para
curtir, esquecer das grandes roubalheiras que continuam, ininterruptamente, a
retirar verbas da educação, da saúde, da segurança, da infraestrutura, da ciência
e da cultura. Não nos lembramos mais do mensalão, nem de seus autores, que
ainda não foram julgados e correm o risco de não o serem por decurso de prazo.
A vida continua. Escândalos vão e
vêm. Novos alvoroços aparecerão e logo nos esqueceremos deste. Talvez
Demóstenes perca o mandato e fique inelegível por muito tempo. Coitadinho, não
fez nada de mais, foi apenas amigo do amigo, e amigos são para sempre, como o
Zé Dirceu que continua aos beijos e braços com os companheiros, provando a
todos nós que certas coisinhas que se praticam na política são normais, desculpáveis,
plenamente aceitáveis. Afinal, como disse Lula, é apenas caixa dois.
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