A lei das
concorrências manda explicitar os requisitos mínimos a serem atendidos pelos
bens e serviços adquiridos por órgãos públicos. Também ordena contratar o
proponente de menor preço, e que a concorrência seja pública e aberta a qualquer
um que cumpra exigências gerais permanentes. Sendo as licitações públicas e de
acesso geral, principalmente nos pregões pela Internet, é praticamente
impossível a formação de carteis de fornecedores, de sobre preços e de propinas.
O Estado adquire pelo menor preço e a moralidade fica preservada, mas o
concorrente que oferece o melhor custo/benefício certamente fica de fora. É um
convite à mediocridade.
No intuito de
dinamizar as operações da Petrobras e permitir a aquisição da oferta de melhor
custo/benefício o governo Fernando Henrique editou decreto específico para que a
Petrobrás faça aquisições por meio de carta-convite a fornecedores que
satisfaçam determinados critérios econômico-financeiros e tecnológicos. A
Petrobras elabora uma proposta como se fora um dos concorrentes, compara esta
proposta com as dos fornecedores e adquire a proposta de melhor custo benefício
que se mantenha na faixa entre menos quinze a mais vinte por cento do preço da
proposta de referência.
Como é muito
pequeno o número dos fornecedores que satisfazem os rigorosos critérios
econômico-financeiros e tecnológicos estabelecidos, todas as empreiteiras se
conhecem e frequentemente formam parcerias em projetos nacionais e
internacionais, inclusive com a Petrobrás, é muito fácil a formação de cartel que
determine qual dos concorrentes será o vencedor na próxima carta-convite. Os
demais ofertarão preços superiores ou pior custo-benefício, garantindo a
vitória do escolhido.
Os critérios de
elaboração da proposta paradigma são rígidos, mas plenamente conhecidos pelos
membros do cartel, para os quais é fácil situar a proposta vencedora de cinco a
dez por cento acima do preço de referência, quando poderia ser bem mais abaixo.
Este é o sobre preço de dez a quinze por cento usufruído pelo cartel em todos
os contratos com a Petrobrás. Como a maioria dos funcionários da Petrobras são
honestos e não aceitam propina, as empreiteiras embolsam todo o lucro mais o
sobre preço. É do máximo interesse das empreiteiras preservar o status quo e é
por isso que se mostram tão solícitas em atender pedidos e oferecer propinas a
funcionários envolvidos na licitação e a políticos. Algumas propinas se
realizam por via de doações políticas legais, embora derivadas de procedimentos
absolutamente criminosos.
Minha sábia sogra
dizia que paredes tem ouvidos e matas enxergam muito bem, o que torna
impossível preservar segredos. Todas as empreiteiras do cartel sabem de tudo,
todos os políticos que pedem doações eleitorais a empreiteiras e funcionários corruptos
sabem de tudo e, é claro, a alta administração do governo, das repartições e
das estatais também sabem de tudo. Não vejo ninguém com vendas e tampões nos
olhos e ouvidos. Não existem segredinhos de Polichinelo no mundo político.
Esse é o ambiente
em que funcionários - honestos, mas descompromissados, cada qual cumprindo estritamente
sua parte no processo, vivendo com tranquilidade suas vidas e deixando que
outros vivam tranquilamente as suas - obedecem tranquilamente decretos e
regulamentos.
Mesmo que alguns
funcionários corretos queiram corrigir anomalias, se deparam com a certeza de
que as instâncias de denúncia, superiores hierárquicos e órgãos de auditagem ou
correição não são confiáveis. Quase sempre os bem intencionados acabam punidos
por “desconformidade”.
Esse é também o
ambiente que propicia a proliferação dos germes da desídia, do desleixo, da
falta de ética, da corrupção e do crime.
São os funcionários
da Petrobras honestos? Ah, sim, são.
Excetuando alguns
corruptos, a grande maioria é simplesmente honesta. Nem todos são, mas a
grande maioria é comprometida com a
empresa, com os ideais que a criaram e com seus objetivos primordiais:
pesquisar, extrair, refinar e tornar o Brasil autossuficiente em petróleo e
combustíveis seus derivados.
O povo brasileiro
espera e apoia esse corpo de funcionários abnegados que - em movimento interno
silencioso, perseverante e firme - induza a direção da empresa a estabelecer
canais e instâncias confiáveis que assegurem a conformidade dos atos e
procedimentos da empresa com a ética e com a Lei.
O decreto de
Fernando Henrique não é um mal em si. Pelo contrário, dinamiza os procedimentos
e permite a busca da excelência em uma empresa extremamente dependente de alta qualidade
e tecnologia avançada. Se a Lei da concorrência induz à mediocridade, esse decreto premia a melhor adequação.
A impunidade sempre
foi e será o principal indutor do crime. A condenação dos culpados do petrolão
servirá de exemplo e inibidor de empreiteiras, funcionários e políticos que
almejem lucro criminoso.
O povo brasileiro
também confia, apoia e espera que Polícia Federal, Ministério Público, Justiça
e Comissão Parlamentar de Inquérito passem a limpo o escândalo do petrolão,
separem o joio do trigo e punam os culpados de mais um escândalo que precisamos
purgar para que a alma brasileira seja lavada.
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