Confesso que quando jovem usava da
mesma medida moral para todos os casos. Mas essa generalização, de julgar a
todos do mesmo jeito, cessou quando conheci aquela que viria a ser minha futura
sogra, mulher virtuosa, íntegra, boníssima, mas adepta de outro partido
político. Eu me perguntava, como pode tão boa gente ser partidária de tanto
mal? Então me apercebi que o mal pode ter um lado bom, um encantamento que
atrai pessoas menos atentas à complexidade das coisas e das causas políticas e
não se apercebem que o mal convive com o bem.
Esta semana em Santarém, compareci a festiva
reunião familiar, irmãos, filhos e sobrinhos vieram de toda parte, inclusive,
alguns que vivem em Belém compareceram e tive o prazer de com eles conversar
sobre muitas coisas, família, antepassados, romances, estudos, futuras
profissões e, não poderia faltar, Estado do Tapajós. Uma das sobrinhas me
declarou com ênfase, tio, eu amo Belém! E o mesmo sentimento se repetiu em
todos. E eu me perguntava: como podem crianças e adolescentes tão bem educados,
ternos e bons amar tanto mal?
Então caí em mim, o mal não está na
cidade, nem no povo de Belém. O mal reside em uma coisa chamada “espírito do
Grão Pará", algo profundamente enraizado, uma sede de poder, potência e
posse, ânsia de se sentir dono de imensos territórios, mania de grandeza. Algo
que não é do povo de Belém, mas que domina o pensamento de suas perversas elites,
gente que sacrifica seu próprio povo no altar de interesses mesquinhos.
O Estado do Maranhão e Grão Pará se
estendia do Piauí aos confins do Rio Negro. Encolheu. Maranhão e Grão Pará se
separaram. Depois, Amazonas, Amapá, Rondônia e Roraima, sucessivamente, se emanciparam um por um e, a cada separação, um sentimento de frustação, de
perda, um desconsolo inconformado, profunda sensação de causa perdida. As
elites não se conformavam.
A par disto, o hábito de sugar sangue
e riquezas, o tutano da Amazônia. Belém não se fez por si mesma. Foi feita pela
riqueza que extraiu de longínquos rincões, de igarapés e rios, de campos e
matas, de bichos e gentes, de povos que se mataram de trabalho e de malária
para fazer a grandeza e o luxo das elites da Grande Belém do Grão Pará.
Mais ainda, o hábito de menosprezar
as cidades e povos do interior. As elites do Grão Pará consideram gentalha, zé
povinho, os povos do Marajó, Tocantins, Xingu, Tapajós, Transamazônica,
Trombetas, Baixo-Amazonas, Carajás, Bragança e do Litoral. Para elas, só Belém
é Pará, e Pará é Ver-o-Peso, Docas, Praça da República (Largo da Pólvora),
Teatro da Paz, Batista Campos, Basílica e Círio de Nazaré. Onde fica Santarém,
Altamira, Oriximiná, Marabá, Óbidos, Jacareacanga, enfim onde fica o interior,
ninguém sabe.
E o hábito de usurpar. Um secretário
do governo de um ex-governador do Pará acompanhou um industrial paulista a
Santarém onde este pretendia implantar uma fábrica, importante gerador de
empregos e renda para milhares de agricultores familiares da região do Lago
Grande do Curuai.
Estavam os dois almoçando quando e
secretário instou ao investidor que não instalasse a fábrica em Santarém, mas sim
em Belém ou seus arredores, apontando grandes vantagens para essa localização.
O industrial olhou espantado para o político, e sua falta de ética, e ponderou
que além de preferir localizar seu parque industrial próximo à fonte de matéria
prima, já havia assumido compromissos tanto financeiros quanto morais com a
região do Tapajós.
Quando uma bomba d’água de Santarém
voltava de ser consertada em São Paulo foi instalada em Belém, substituindo
outra quebrada no Guamá, deixando o desvalido povo de Santarém sem água por
vários meses.
Essa ganância de usurpação, esse
desprezo e falta de consideração é típica daquele perverso espírito do Grão
Pará.
(Continua na próxima semana)
Um comentário:
Grande Sebastião Imbiriba! Suas crônicas e suas sacadas espetaculares recheadas de vivencia e conhecimentos. Impregnadas de sentimento, de zelo por seus conterrâneos e por sua terra natal. Mas nem por isso deixando de ser repleto de verdades. Parabéns Guerreiro do Tapajós, por sua clarividência e sua garra tenaz!
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