A conversa com os sobrinhos continuava com perguntas agudamente
inteligentes que me faziam meditar antes de oferecer resposta. Uma das
sobrinhas havia me relatado seu namoro e as complicações que teve por causa
dele. É seu único namoro, primeiro romance que o pai, severo e atento, queria
proibir, mas a mãe, prudente e sábia, o convenceu de que é melhor a filha namorar
com conhecimento e acompanhamento dos pais, do que induzir a jovem a
subterfúgios e mentiras. Perguntei à menina, agora com quinze anos, aonde achava
que essa relação iria conduzir. Ela respondeu que se tudo corresse como
esperado ela e o namorado iriam continuar estudando normalmente, se formariam,
casariam, constituiriam seu próprio lar, teriam filhos e netos, e viveriam
felizes para sempre.
Lindo. Comovente. Gostei da resposta. Demonstra a boa educação e
orientação para a vida que recebe em casa e na escola. Ela e os pais estão de
parabéns. Mas perguntei se havia semelhança entre sua própria vida, seus interesses,
suas aspirações de desenvolvimento, prosperidade e felicidade, e as aspirações
de dois séculos do povo do Baixo Amazonas e do Tapajós por autonomia
administrativa, um povo que quer dirigir o próprio destino de acordo com as
peculiaridades culturais, étnicas e geográficas da região.
Sim, respondeu ela, acho muito justo que alguém que se
desenvolve e adquire personalidade cultural e econômica própria queira e tenha
todo o direito de dirigir sua própria vida, assim como eu mesma quero, e outras
regiões que se tornaram estados da federação brasileira. Sim, confirmou a bela
e inteligente jovem, o Estado do Tapajós tem todo direito de se tornar autônomo
e seguir seu próprio destino.
Então perguntei ao irmão da moça, dois anos mais jovem do que
ela, o que ele pensava disso tudo, da ânsia de sua irmã e do povo do Tapajós, a
um determinado ponto de desenvolvimento, regularem suas próprias vidas. O
rapaz, também brilhante, respondeu que não tinha opinião definitivamente
formada, que achava que a irmã e o Tapajós estão certos em desejar autonomia em
dirigir suas próprias vidas, porém, que poderia haver outras formas de atingir
os objetivos, tanto do Tapajós quanto do Carajás, que não fossem pela
separação.
Perguntei quais seriam estes meios e ele indagou: Não é o
desenvolvimento que vocês querem? Esse desenvolvimento não pode ser mais bem
conduzido por um trabalho conjunto, sem separação?
Que excelente pergunta. Mas resposta é simplesmente NÃO! Não
queremos o desenvolvimento pelo desenvolvimento, não desejamos um
desenvolvimento imposto de cima pra baixo, enfiado por goela adentro, e citei o
caso da Orla de Altér do Chão.
Veio uma equipe de Belém com um projeto até razoável e mostrou o
que iriam fazer para melhorar o visual da vila. Os moradores disseram não, não
era aquilo o que queriam, queriam assim e assado, mas não do jeito que os
Arquitetos do Grão Pará mostraram. O pessoal de Belém foi embora e, de repente,
veio uma empresa de fora e fez a obra exatamente como no projeto original
imposto sem satisfazer, nem no mais ínfimo detalhe, o que os moradores
desejavam.
Relembrei fatos anteriores, fatos de desde sempre, de Mendonça
Furtado mandando mudar os nomes de todos os lugares, arbitrariamente, sem
consultar se os moradores das vilas e aldeias desejavam ou aceitavam novos
nomes para seus sítios, se Pauxis queriam se chamar Óbidos, ou Tupaiús,
Santarém. E o arrogante interventor Magalhães Barata, desembarcando do Aquidabã
no Trapiche de Santarém, distribuindo ralhos e reproches a torto e a direito
por todos os que o iam receber, os que o faziam por ofício e os pelo prazer de
puxar saco de potentado. Exemplos que se repetem a todo instante, todo o tempo.
Meu sobrinho ficou calado por algum tempo, refletindo, e
respondeu: É tio, tem jeito não, tem mais é que separar mesmo para que todos
sejam felizes para sempre.
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