Tem mais é que separar, mesmo, para que todos sejam felizes para
sempre. Estas sábias palavras de meu sobrinho poderiam ter sido concretizadas
no plebiscito de outubros de 2011, se as elites do Grão Pará tivessem grandeza
de espírito para perceber e praticar o que é justo, magnanimidade para conceder
o que nada lhe custa e clarividência para decidir o que seja o melhor para
todos.
E o melhor seria cada um pro seu lado, Pará, Carajás e Tapajós,
cada qual cuidando de sua vida, realizando sonhos de autonomia, felizes para
sempre. Separados mas se amando, porque o amor que existe entre pais e filhos
não se extingue quando estes se tornam maiores e independentes. Pelo contrário,
o amor aumenta com a chegada dos netos e há entendimento pleno, afeto sincero e
puro.
O povo do Oeste do Pará, do Tapajós, sempre amou o povo de
Belém, sempre amou as pessoas que vivem em Belém, e sempre amou a cidade de
Belém, sua eterna capital, onde muitos estudaram, se formaram, adquiriram
profissão, conquistaram amigos, relações de negócios e de família. Belém, a
cidade de todo o Pará.
Mas a recíproca nem sempre foi verdadeira. Nativos do Baixo
Amazonas, nem sempre, porém muitas vezes, foram e são tratados pelas elites
belenenses de cima para baixo, com ares de superioridade, como senhores do Grão
Pará condescendo em se relacionar com inferiores merecedores de pouca consideração
e respeito.
Esse tipo de relação se revelou por inteiro no plebiscito. O
povo do Tapajós veio - cheio de amor e esperança, confiando plenamente em que o
povo de Belém se comportasse como irmãos, filhos dos mesmos pais - pedir apoio
e benção para se emancipar, seguir seu destino independente, como acontece em
qualquer família comum.
A recíproca, no entanto, não foi verdadeira. Agindo da mesma
forma perversa com que colonizadores portugueses e espanhóis percorriam sertões
aprisionando e escravizando indígenas, as igualmente perversas elites do Grão
Pará mantiveram os grilhões com que subjugam os povos do Carajás e Tapajós.
Usando todos os meios de que dispõem - poder político e
econômico, poder de persuasão dos grandes jornais, da TV, do Rádio e de
artistas comprados a peso de ouro - as elites do Grão Pará convenceram o inocente
povo de Belém de que o bem era o mal, divisão era perversão, Carajaenses eram
forasteiros indignos roubando riquezas alheias e Tapajoaras bugres ignorantes
incapazes de gerir seus próprios destinos.
Enquanto os propagandistas do Tapajós e Carajás apregoavam as
virtudes da multiplicação dos Estados, com proposições lógicas e sólidas, as
elites do Grão Pará, promotores do NÃO, proclamavam inverdades e apelavam para
sentimentos menos nobres: egoísmo, ganância e preconceito, com sua propaganda
subjetiva e sentimentalista, ridicularizando e agredindo, até fisicamente, os
pacíficos defensores do SIM.
Essa infeliz propaganda do NÃO feriu mortalmente o amor do povo
do Tapajós por Belém, o que era afeto se transformou em ressentimento, rancor e
até ódio, num desamor se dirige às elites do Grão Pará, mas se reflete,
irracionalmente, no povo de Belém.
E, quando esse ressentimento se manifesta em queixas amargas do
povo do Tapajós, o povo de Belém se ressente e fica também amargurado. As
sementes do ódio estão lançadas. E com tanta mais força quanto mais intensa foi
demonstrada a vontade das partes. 3/4 do povo de Belém votaram NÃO. 3/4 dos
povos do Tapajós e Carajás votaram SIM. E o povo do Xingu ficou dividido meio a
meio.
A divisão está feita. Hoje, sabemos que existem cinco estados
perfeitamente delimitados, resultante do plebiscito, Pará, Marajó, Xingu,
Carajás e Tapajós. A divisão não se realizou por marco legal. A divisão existe
por vontade e sentimento do povo.
Antes, a separação era sonho de patriotas visionários do Tapajós
que amavam Belém. Hoje a separação é fato provocado por resentimento e mágoa
contra Belém.
O povo do Tapajós amava o Pará, amava Belém. Mas onde havia
amor, existe agora rancor e ódio. Um dia, quando a autonomia chegar e a
bandeira do Tapajós tremular vibrante na brisa da Liberdade, o afeto antigo
ressuscitará, e o amor reinará sobre o triplo Pará.