26 de maio de 2008

Vivências – Mudando de emprego

Este artigo inicia uma série descrevendo observações efetuadas ao longo da vida profissional do autor. Matheus é personagem fictícia criada para afastar a aparência de personalismo, mesmo porque, no mais das vezes, os fatos narrados são experiências alheias. O autor tem a esperança de que os exemplos sejam proveitosos a algum leitor que o honre com sua preciosa atenção.
Matheus chegara à cidade grande com cartas de recomendação, graças às quais logo obteve colocação, como ajudante de técnico eletro-mecânico, em importante empresa alemã do ramo eletro-eletrônico e de telecomunicações. Muito interessado em aprender a profissão e cheio de iniciativa, desempenhava bem suas funções. Se, por um lado, era levemente antagonizado por colegas com muito maior tempo de casa, que não viam com bons olhos sua aplicação no trabalho e grande interesse em aprender, por outro lado tinha a admiração e incentivo dos chefes, merecendo seguidas promoções e aumentos, sempre, no entanto, dentro dos limites da estrita política salarial da empresa. Um ano depois já fora promovido a técnico pleno.
A árdua rotina de trabalho na oficina, das sete da manhã às seis da tarde, era seguida pela freqüência às aulas do curso científico que se estendiam até as onze ou mais. Um dos colegas de estudo o avisou de que a empresa onde trabalhava recrutava novos empregados. Matheus aproveitou imediatamente a oportunidade e se apresentou à multinacional do ramo de computadores, onde foi aprovado nos testes de seleção. O encarregado de Recursos Humanos foi pessoalmente pedir informações ao o chefe de Matheus e este foi chamado para um período remunerado de oito meses de treinamento, ao qual se seguiria a contratação definitiva com salário ainda maior. Muito feliz com a possibilidade de progresso profissional, desejando ser um bom moço, foi comunicar a seu diretor que fora convidado para nova colocação. O diretor se mostrou inconformado, absolutamente não abriria mão de tão bom funcionário, lhe aumentaria imediatamente o salário para o mesmo nível inicial da outra empresa e prometeu estágios na Alemanha.
O resultado foi desastroso. O salário de Matheus ficou em nível muito acima ao de todos os seus colegas da oficina, quase igualando o do chefe, criando severo antagonismo e deteriorando o ambiente de trabalho. Como já não havia clima na oficina, Matheus foi transferido para o escritório a exercer funções burocráticas que detestava. Seu salário dera salto extraordinário e por isso nunca mais obteve outro aumento. As oportunidades de estágio na Alemanha nunca apareceram. Enquanto isto, os admitidos na companhia americana de computadores cumpriram os meses iniciais de treinamento e foram efetivados com salário bem superior ao de Matheus. Muitos fizeram carreira e atingiram altos postos na empresa. Alguns foram trabalhar e outros receberam treinamento nos Estados Unidos.
Matheus arrependeu-se amargamente, mas, tendo outras oportunidades aproveitou-as. Anos mais tarde, já em outra empresa, multinacional britânica, um colega passou a se comportar misteriosamente até que, de repente, apresentou sua carta de demissão, afastando-se sem revelar para onde ia; era assunto pessoal. Somente depois de quase dois meses houve notícias dele e o ex-colega revelou ter assumido importante gerência em grande firma de telecomunicações. Ao ser cumprimentado pelos antigos companheiros, comentou: “meu ex-patrão não foi capaz de observar meu progresso intelectual e excelente desempenho funcional, não teve a iniciativa de me promover ou não tinha como fazê-lo. Portanto, não havia porque eu permanecer ali, marcando passo, nem me sentir obrigado a lhe informar de minhas intenções. Estou muito feliz aqui, ganhando muito mais, prestigiado e fazendo algo que me dá maior satisfação. Se nada adiantei aos colegas é porque estas coisas se fazem melhor em segredo”.
Tempos depois, o proprietário de uma clínica oftalmológica pediu a Matheus que desenvolvesse um programa de emissão do faturamento e que treinasse uma funcionária encarregada desse trabalho. Segundo o médico, dentre as funcionárias de sua equipe, era a mais interessada e aplicada ao trabalho. O programa foi implantado e a funcionária treinada com êxito. Passados alguns meses, reencontrando o médico, este se queixou amargamente de que a funcionária o tinha abandonado para ganhar mais em clínica concorrente, seu investimento fora perdido, ninguém mais sabia operar o programa, o faturamento voltara e ser cheio de erros e ele tinha grandes prejuízos. Matheus perguntou-lhe se, após o treinamento, a funcionária recebera aumento de salário correspondente à nova função, o médico se espantou com a pergunta, disse que não tinha nenhuma obrigação disto. Pode ser que não, o certo é que ficou sem a funcionária, sem faturamento automatizado e com os prejuízos decorrentes dos erros que o programa evitava. E a funcionária estava feliz no novo emprego.
Muitos empregados não se dão conta do próprio valor e são poucos os que ficam atentos às oportunidades que o mercado oferece àqueles que se aperfeiçoam e atingem altos níveis de eficiência. Marcam passo indefinidamente por simples inércia.
A maioria dos patrões considera natural que seus empregados melhorem o desempenho, a produtividade e a capacidade de decisões acertadas sem que isto implique em compensação adequada para os manter contentes na empresa. Não é surpresa que os percam para os concorrentes.
O mercado está cheio de oportunidades para os vocacionados, talentosos, habilitados e qualificados. Enquanto isto, no mundo inteiro, milhões de jovens ficam em casa, vivendo a custa de parentes, entregues ao ócio, nada fazendo, sem ao menos ler um livro ou praticar esporte, muitos nem assistem televisão. E se queixam amargamente de que não há empregos disponíveis.
O posto de trabalho, longe de ser um direito, é privilégio de quem tem vocação, talento, habilitação, qualificação e espírito empreendedor. Privilégio e fonte de contentamento para ambos, empregado e empregador.

Próxima crônica: Adquirindo know-how. Até lá!

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