Sebastião Imbiriba*
Vivemos em um mundo de conveniências
particulares, cada um de nós com as próprias, das quais relutamos em nos
afastar. Felizmente, na maioria, tais interesses são coerentes, todos na mesma
direção e sentido, conduzindo à cooperação, ao trabalho conjunto pelo
"interesse-comum".
Assim é entre tribos mais primitivas,
nas quais os indivíduos conjugam seus esforços na pesca, caça, agricultura ou
pastoreio, de modo a que todos se alimentem e se protejam, até se defendam.
Quando, entre a comunidade, surgem
interesses divergentes que não se resolvam entre os querelantes, terceira parte
quase sempre necessária em qualquer conciliação, líder, chefe, cacique ou o
conselho dos anciãos interfere mediando, conciliando, corrigindo, até
extinguindo a causa dos problemas, quer pela expulsão ou execução dos culpados.
Este processo evita o surgimento de
criminalidade nesses meios sociais. É
por esta forma que povos mais primitivos vivem em harmonia dentro das
respectivas comunidades. Não fora assim e estaríamos todos extintos antes que
chegar à civilização de nossos dias.
No meio do percurso civilizatório, no
entanto, na medida em que tribos mais aguerridas e prepotentes se julgaram com
precedência na utilização de recursos naturais estáticos e declinantes ou
direito de posse sobre bens acumulados por outros povos os conflitos armados se
transformaram no terror constante da humanidade, as guerras.
Os conceitos de liberdade e tolerância
surgidas com o Iluminismo, aliados ao cansaço da mortandade bárbara e inútil
das guerras religiosas decorrentes da Reforma, levaram os povos europeus e
norte-americanos à tolerância religiosa que evoluiu para a tolerância política
e comportamental dos dias de hoje.
Os acordos da siderurgia e do carvão pós
Segunda Grande Guerra conciliaram interesses econômicos transnacionais de forma
tão bem sucedida que evoluíram para a União Europeia e influenciaram a criação
de diversos outros grupos de interação econômica.
Os interesses econômicos nacionais
passaram a integrar sistemas sinérgicos transnacionais. Europa, América do
Norte, Japão, Austrália e Nova Zelândia compõem sistema social altamente
evoluído, no qual a conciliação de interesses se realiza por processos
negociais e onde as liberdades e a tolerância são predominantes, mesmo, o que é
normal, quando haja possibilidade de aperfeiçoamento.
Brasil é paradigma de tolerância.
China e Índia evoluem no caminho correto. O mundo moderno se transforma
paulatinamente numa grande aldeia globalizada na qual os conflitos de
interesses tendem a ser resolvidos pela primitiva forma tribal de conciliar,
agora aperfeiçoada por novos conceitos filosóficos, éticos e morais, daí a
institucionalização de meios de conciliação e julgamento, desde o mais simples
arbitramentos entre particulares, passando por órgãos de conciliação e
julgamento nos estados nacionais, até à Organização das Nações Unidas e seus
diversos instrumentos negociais e jurisdicionais.
A grande dificuldade reside na intolerância e
nos preconceitos que perduram, mesmo em países desenvolvidos, principalmente nas
populações de nações subdesenvolvidas da América Latina, África e Ásia,
principalmente, mas não só nas de convicção islâmica, cuja cultura as impede de
entender as grandiosas vantagens da troca do fundamentalismo fanático e
irracional pela prática das liberdades e da tolerância. Estes povos são, no
mais das vezes, chefiados por líderes demagógicos que colocam seus próprios
interesses pessoais acima do interesse de suas nações.
Há dois caminhos para que a Humanidade
viva em uma aldeia pacífica e harmônica, a primeira seria o da neutralização do
malfeitor. Este é o caso das intervenções bem sucedidas na Guerra do Golfo e na
antiga Iugoslávia. É também o caso da infeliz guerra que infelicita o Iraque.
Tais procedimentos são penosos, eticamente condenáveis e, como vimos no Vietnam
e agora no Iraque propensas à derrota.
O outro caminho é o da negociação para
o que é necessária infinda paciência no ouvir. Ouvir para entender não apenas
os interesses explícitos, mas os recônditos e até os inconfessáveis e encontrar
maneiras de que as partes se satisfaçam. Assim será possível conviver em paz.
Os mais civilizados e capazes precisam
ouvir para conciliar.
* Artigo publicado em O Estado do
Tapajós, jornal diário de Santarém, Pará, onde Autor (75) escreve sobre temas
de interesse geral, principalmente amazônicos.
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