17 de março de 2008

O SUS d’Ana Júlia

Santarém, 18 de março de 2008

Durante a campanha eleitoral para o governo do Estado do Pará, Ana Júlia e Jader Barbalho montaram a coligação, que lhes daria a vitória, trocando apoio político por parceria na administração do futuro governo do Pará. Até ai, nada mais do que um acordo político usual em todas as democracias, principalmente em sistemas parlamentaristas, mas também praticado em regimes presidencialistas.

O que se revelou, logo após a posse d'Ana Júlia, foi que tal acordo é, de fato, conchavo concedendo feudos administrativos ao PMDB, reserva de domínio para nomeações, contratação de pessoal e compras com e sem licitações nos dispêndios com materiais, equipamentos e obras, onde o PMDB revelou a face cruel de parceiro infiel, execrável e incompetente.

O PMDB presta enorme desserviço a Santarém, ao Oeste do Estado e ao Pará todo. O histórico da administração do Hospital Regional é contínuo desenrolar de ganância política na tentativa de estabelecer ali seu curral eleitoral, de incompetência na formulação e execução de estratégias políticas, na falta de critérios na gestão da Secretaria de Saúde e do próprio Hospital.

O ranço da tradicional forma de governo das oligarquias que permeia esse partido é patente em todos os atos dos comandantes do PMDB com suas práticas políticas de clientelismo, de se assenhorearem de postos-chave para deles tirarem proveito pessoal e político. Mas nada disto é de estranhar conhecendo-se os protagonistas, tanto locais quanto os regionais e estaduais desse partido.

Tão grave e condenável, mais ainda, pela responsabilidade na qual está investida, é a displicente e alienada forma como Ana Julia olha para outro lado enquanto seu parceiro tripudia sobre o povo do Oeste e de Santarém. A condescendência com que a Governadora afaga e deixa agir livremente, impunemente, os celerados que afligem nossa população. A ética foi relegada ao chiqueiro, o que importa é a manutenção da parceria para as próximas eleições e as que se seguirão. A moral foi conspurcada na lama dos interesses mesquinhos, o que vale é manter a capacidade de nomear e gastar o dinheiro público sem medidas e sem controles.

O resultado é o que todos sabemos. Um hospital moderno, recém construido, quase totalmente equipado, pouco faltando para estar completo com os implementos mais sofisticados, que poderia oferecer serviços e tratamentos que nem os melhores hospitais e clínicas particulares estão equipados, até mesmo os de Belém. No entanto, permanece inútil, deteriorando-se, pouco a pouco sofrendo erosão do canibalismo de peças e equipamentos, enquanto a população de toda esta região sofre com falta de assistência médica.

É a mais completa carência de ética administrativa, de sentimentos, de compaixão com os que sofrem, de respeito aos cidadãos, é o total menosprezo por parte da Governadora ao povo que a elegeu massiçamente nesta região.

Ao conluio Jader-Ana Júlia associa-se a cumplicidade de toda a cadeia de lideranças de seus partidos. São cúmplices ao não protestarem energicamente. São cúmplices ao aceitarem passivamente a agressão. São comparsas no crime que se comete contra cada um de nós e a eles próprios que precisamos ou poderemos precisar do Hospital Regional.

Oxalá o povo desta região jamais esqueça tal desserviço e tamanha traição às suas esperanças.

 

11 de março de 2008

O PSM de Maria do Carmo

Santarém, 12 de março de 2008

 

À Ilma.sra.         

Dra. Maria do Carmo Martins

DD Prefeita Municipal de Santarém.

 

Minha querida Maria,

Você sabe, e reafirmo, da minha admiração, respeito e benquerença por você. Estou aqui para apelar ao sentimento que constituiu a base da filosofia de vida de seu pai, e também da sua: a compaixão. Compaixão que só os corações mais nobres sabem possuir e que o caso que relatarei está a requer.

No final da tarde de segunda-feira, três de março de dois mil e oito, Valdinéia Lima Barbosa, de vinte e quatro anos, solteira, doméstica, sofreu um acidente de moto. Às dezenove horas e trinta minutos Valdinéia entrou no Pronto Socorro Municipal com fratura exposta na perna esquerda. A ponta do osso quebrado aparecia na dobra da perna. Um curativo foi realizado e a paciente permaneceu na maca da sala de pronto atendimento por toda a noite de segunda para terça, este dia todo, e só foi transferida para o leito dezoito do centro cirúrgico na quarta-feira, quando lhe disseram que seria operada.

Apesar do sofrimento, atenuado no possível pela dedicação impotente das enfermeiras que poucos recursos dispõem, Valdinéia não foi operada nem na quarta, nem na quinta, nem na sexta ou no sábado, muito menos, no domingo. Sete dias sem atendimento. Sete dias sem prestação de socorro, porque não considero atendimento empurrar com a barriga uma providencia que deveria que ser imediata.

No domingo, numa reunião social, tive a felicidade de encontrar meus amigos Dr. Emanuel, Secretário Municipal de Saúde e sua esposa, Dra. Francimeire, Diretora do Hospital Municipal. Cumprimentei-os pela campanha contra a dengue. Também relatei o infeliz caso de Valdinéia. Dr. Emanuel me fez a honra de explicar cientificamente as razões pelas quais operações não possam ser realizadas e que uma destas poderia ser o caso. Dr. Emanuel sugeriu a Dra. Francimeire que procurasse se inteirar do caso na segunda-feira.

Estou muito honrado pelas detalhadas explicações de Dr. Emanuel. Aliás, devo a ele pedido de desculpas por ter levantado questão profissional em reunião social. Realmente, grande inconveniência de minha parte abordar tão desagradável assunto numa festa onde todos estão para se divertir.

Mas, se em lugar de Dr. Emanuel, fosse Dr. Everaldo, seu pai, ou Dr. Waldemar Penna, nosso saudoso amigo, a quem eu relatasse o sofrimento de Valdinéia, estou certo de que a coisa não ficaria apenas numa divagação sobre hipotéticas razões médicas para tão flagrante e odiosa omissão de socorro. Certamente, providências imediatas seriam tomadas.

Na manhã de segunda-feira, dia dez, mais uma vez, o cirurgião (sei mas não quero citar o nome) informou à paciente que a operação não se realizaria. Foi então que Zando, cunhado de Valdinéia, chegou com um repórter de TV e questionou energicamente o médico. Imediatamente, tudo o que era necessário foi providenciado, os pinos e todo o material que faltava apareceram, a paciente logo estava preparada e pronta para ser operada. A operação começou por volta do meio-dia e meia. Continuo apreensivo.

O caso de Valdinéia é emblemático da imundície, desleixo, displicência, arrogância, desorganização, incompetência e indiferença com o sofrimento humano que imperam no Pronto Socorro Municipal.

É por isto que apelo à sua sensibilidade de mulher, ao amor e à compaixão que são marcantes características suas, para que use a autoridade que lhe demos com nosso voto e faça mudar esta insuportável vergonha para você e para todos nós que amamos esta cidade e este povo.

Atenciosamente,

De seu admirador,

Sebastião

4 de março de 2008

Um livro mais que interessante

Um livro mais que interessante

Desde as priscas eras da Antiguidade a humanidade acreditava que o universo era composto por quatro elementos primordiais: Terra, Água, Fogo e Ar. Embora muitas propriedades do ar indicassem que, ao contrário de se tratar de elemento, seria mistura ou composto, químicos daqueles tempos, os alquimistas, encontravam justificativas mirabolantes para explicar o inexplicável, por exemplo, certas substâncias que, ao serem calcinadas, em lugar de perder, ganhavam acréscimo de peso. Tal fenômeno era explicado pela provável existência de um fluido invisível denominado flogístico. O método científico não existia, a química ainda não fora estabelecida. O ar e os gases eram enorme mistério.

De como tal mistério foi desvendado é o tema de interessantíssimo livro que acabo de ler: "A World on Fire" (Viking, Penguin Group, New York, 2005), de Joe Jackson, autor do qual nunca tivera notícia. Surpresa que me encantou por vários motivos.

Nas décadas finais do século XVIII, enquanto a ameaça da revolução ofuscava o fulgor do Iluminismo que a havia inspirado, dois brilhantes cientistas, simultaneamente, descobriram o oxigênio. Era um avanço que alteraria o curso da Ciência, da História e do pensamento humano. De um lado, um humilde e pobre dissidente inglês, Joseph Priestley, de outro um rico e aristocrata francês, Antoine Lavoisier. Tais eram os improváveis competidores. A feroz rivalidade entre eles, na corrida para resolver o enigma do ar, tornou-se uma competição ainda mais exacerbada pelo tumulto da época.

"Um Mundo em Fogo" faz reviver as ciclópicas mudanças intelectuais e políticas que introduziram a ciência moderna, em particular a Química. Projetada contra um painel de conflagrações - Revolução Americana, o assalta à Bastilha, o Terror, a contra-revolução e a repressão inglesas - esta destra narrativa tece e junta biografia e história, paixão científica e ira política. Com suas descobertas em laboratório preparando o caminho para a identificação dos elementos e a tragédia de seus destinos, Priestley e Lavoisier resumem a odisséia do cientista na idade moderna.

Quem primeiramente descobriu o oxigênio? O pastor dissidente inglês Joseph Priestley ou o aristocrata francês Antoine Lavoisier? A pergunta transforma-se em tema patriótico numa época em que França e Inglaterra eram inimigas em estado de guerra. Priestley foi o primeiro a isolar o oxigênio, mas não compreendeu a natureza de sua descoberta e, ainda agarrado à velha teoria do flogístico, chamou seu gás de "ar deflogisticado". Lavoisier, que desenvolveu suas próprias pesquisas a partir da descrição das experiências que Priestley inadvertidamente lhe descreveu durante um charmoso jantar em Paris, reconheceu o oxigênio como sendo um gás distinto, dentre os que compõem o ar, e parte integrante do processo de combustão. Além disto, desenvolveu o método e a nomenclatura química usada ainda hoje.

Ambos tiveram destinos infelizes. Priestley, pastor unitariano (pregava o Deus único e negava a Trindade), promotor da Liberdade e oponente ferrenho do Rei e da Igreja (Anglicana), teve sua casa e bens incendiados por uma turba leal ao rei, sua vida ameaçada, sendo obrigado a abandonar sua pátria e refugiar-se na América, onde morreu mansamente, amigo e conselheiro do presidente Thomas Jefferson. Lavoisier, presidente da Academia de Ciências, apesar dos serviços que prestou ao Estado e ao governo revolucionário, foi vítima do Terror, perseguido por Marat e guilhotinado por Robespierre; em seu julgamento, o juiz declarou: "A República não tem necessidade de cientistas".

O livro é rico em detalhes de costumes, política e personagens da época, revelando exaustivo trabalho de pesquisa, e o estilo é escorreito, fácil, cativante, uma delícia de ler.