8 de abril de 2020

Coronavirus versus globalização


Países desenvolvidos se queixam da perda de empregos, mas possuem políticas sociais que protegem os desempregados, enquanto povos do terceiro-mundo, vivendo abaixo da linha de pobreza, necessitam desesperadamente de postos de trabalho. É certo que o desemprego sistêmico, decorrente da automação e da inteligência artificial, cresce exponencialmente, mas demanda capital vultoso e tem que concorrer com a mão de obra barata dos países subdesenvolvidos, permitindo diminuição do ritmo da robotização e do desemprego.
A globalização é democratizante e equalizadora, distribui riqueza por toda parte, soergue populações da pobreza extrema. Globalização - entendida como livre circulação mundial de pessoas, bens, serviços e capitais - é ideal a ser perseguido para a prosperidade do Homem e bem da Humanidade.
Conceito Internacional Global Da Globalização Do Mapa Do Mundo ...A pandemia do Covid-19, no entanto, está demonstrando que tal ideal precisa de planejamento e regulamentação supranacional, para evitar a monopolização da produção de certos bens, de necessidade vital a todos os países, por nações que possuam alguma vantagem competitiva intrínseca, como é o caso da imensidão populacional da China, que a torna o maior mercado interno, cujo atendimento exige e provoca produção industrial em escala extremamente elevada.
O mercado europeu unificado é cerca de um terço, o norte-americano um quarto e o brasileiro apenas quinze por cento do chinês. Os dois primeiros estão há muito na classe dos economicamente desenvolvidos, portanto com pouca alavancagem para crescimento, porque as necessidades básicas de seus povos já estão mormente satisfeitas. O Brasil é forte candidato a rápido desenvolvimento porque tem muita gente carente de necessidades tão básicas como rede de esgoto sanitário. Por outro lado, mais de quinhentos milhões de chineses estão no nível de classe média baixa e inferior a esta, o que significa quase duas populações dos Estados Unidos como mercado ansioso por consumir e crescer.
Além disto, o povo chinês é milenarmente submetido - e acostumado a obedecer - a governos ditatoriais, é extremamente trabalhador e grandemente alfabetizado, ofertando mão de obra laboriosa, disciplinada, instruída e barata, tudo o que a indústria precisa, a par de administração, tecnologia e capital para se desenvolver de modo muito acelerado.
Os industriais e os trabalhadores europeus e norte-americanos prosperaram e enriqueceram no pós guerra e se tornaram gatos gordos que tudo o que querem é ficar dormitando no sofá. Não é atoa que Europa e Norte-américa atraíram milhões de imigrantes para assumir seus trabalhos servis e saíram pelo terceiro-mundo em busca de mão de obra laboriosa, disciplinada, instruída e barata.
Quando Mao Tse-Tung ascendeu ao panteão marxista abriu caminho para Deng Xiaoping realizar a “segunda revolução”, política mista de estatização de poucos setores considerados estratégicos e liberação dos demais para o empreendedorismo e o capital, tanto chineses quanto externos. A partir de 1978, a China iniciou “grande marcha” para a prosperidade que, em quatro décadas, a transformou no maior exportador de bens industriais do planeta, ao ponto se ser hoje quase único fornecedor de alguns produtos e ameaçar monopolizar, por exemplo, a quinta geração de internet móvel.
Neste momento de grande aflição causada pelo coronavirus, o Mundo, em longa fila indiana, implora aos industriais chineses por ventiladores pulmonares essenciais ao tratamento de casos graves de pneumonia provocados por Covid-19.
Donald Trump, considerado por muitos como grosso e antipático, com sua visão de empresário acostumado aos embates de interesses em negociações milionárias, tem acuidade suficiente para perceber a enrascada à qual seu país foi levado por políticos profissionais imediatistas sem visão estratégica de longo prazo. Trump sabe que, além das vantagens competitivas inerentes à cultura chinesa, a China subvaloriza de sua moeda, o yuan, tornando sua produção extremamente atrativa diante do resto do mundo.
A campanha “America first” tem por finalidade devolver aos Estados Unidos os empregos que foram levados a outras nações e evitar que tecnologias de aplicação geral, como a G5, fujam do controle americano.
A constatação, pelo resto do mundo, de estar dependente da China, quanto a equipamentos e insumos para tratamento médico, mesmo os mais simples, como máscaras cirúrgicas, nesta crise do Covid-19, nos leva à reflexão sobre o futuro do comércio globalizado e quanto às providências para diversificar fontes de suprimentos.
Há muito, a China investe maciçamente em infraestrutura e incentiva a produção de alimentos na África para se tornar menos dependente de seus dois maiores fornecedores de proteína: Estados Unidos e Brasil.
Este exemplo deve ser emulado pelos demais países que, como o Brasil, cuja indústria perde sucessivos embates com a China, não só pela menor escala de produção, como por desvantagem cambial. Isto, no entanto, pode conduzir a sucessivos fechamentos de mercados por barreiras burocráticas, sanitárias, cambiais e fiscais, com retrocesso da globalização, que tanto tem contribuído para difusão de riqueza pelo mundo, beneficiando nações extremamente pobres, como Bangladesh, embora, como vemos agora, principalmente a China.
A ONU ou a OMC devem estudar esta questão e propor uma política comercial internacional que, ao mesmo tempo, promova a livre circulação de pessoas, bens, serviços e capitais e evite a concentração de benefícios e monopólios em apenas um país ou região.
O mundo precisa de fontes alternativas, segundos fornecedores, para obter independência do estrangulamento chinês.

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