Desde há dois mil e trezentos anos o Tao Te Ching,
o Livro do Caminho e da Virtude, de Lao Zi, diversos pensadores pregam a paz em
contraposição à violência, recomendando extrema prudência no uso das armas, de
uso em extrema necessidade de autodefesa. Alguns nem neste caso admitem o uso de
força. Em tempos mais recentes, três nomes despontam como líderes da não
violência e da solução pacífica dos conflitos: Mandela, Luther King e Gandhi.
Meu objetivo, aqui, é indagar se a força moral é
mais eficaz no combate à injustiça e à opressão do que a força das armas e,
também, se modernamente, existem métodos e processos que facilitem e alavanquem
o ativismo pacífico a obter resultados sólidos e permanentes.
Comecemos pelo embate entre, de um lado, contestadores
da guerra do Vietnam que incluiu, sucessivamente, objetores de consciência, hippies,
famílias de soldados mortos em combate, jornalistas independentes, a mídia
geral e, por fim, a opinião pública e, de outro lado, o todo poderoso complexo
militar-industrial dos Estados Unidos, o maior poder existente.
Qual a força deste complexo? Era todo poder do
governo dos Estados Unidos, que aplicava a estratégia de autodefesa denominada Teoria
Dominó, de John Foster Dulles, pela qual, se um país caísse sob influência da
União Soviética, ou dos Estados Unidos, os países vizinhos o seguiriam e,
portanto agia, de acordo com a situação, pelo poderio militar, diplomacia ou
subversão exercida pela CIA, contra a expansão do comunismo impulsionado por
movimento revolucionário globalizante, coordenado pelo Comintern, que
controlava os partidos comunistas nos diversos países, e cujos objetivos eram a
derrota do capitalismo, a implantação de ditaduras do proletariado nos países
que dominasse e a instalação da República Soviética Internacional. Eram duas
potências mundiais disputando a hegemonia global.
Pois bem, nos Estados Unidos impera a liberdade de
expressão que possibilitou serem reveladas atrocidades cometidas contra a
população civil no Vietnam, tanto pelas forças sul-vietnamitas, quantos as dos
Estados Unidos, que ofenderam a sensibilidade e a dignidade do povo americano,
o que provocou reação interna da opinião pública, tão poderosa, que obrigou o
governo a retirar as tropas e todo auxílio financeiro do Vietnam do Sul. Era a
força moral dos justos prevalecendo sobre a violência do poder estatal.
Mohandas Gandhi |
O exemplo de Gandhi influenciou tanto a Martin
Luther King, em sua campanha pacífica pelos direitos civis da população negra
nos Estados Unidos, quanto a Nelson Mandela, após sua libertação, na
luta, agora desarmada, pelo fim do apartheid na África do Sul. A força desses
três grandes heróis da Humanidade, Gandhi, King e Mandela, residiu em que suas
reivindicações foram perfeitamente corretas do ponto de vista moral, suas
contestações se voltavam contra opressão injustificável e suas exigências
perfeitamente aceitáveis pelo bom senso comum. Por fim, a correção moral da
luta dos três se estabeleceu em consenso nas sociedades modernas e culturalmente
mais avançadas, de tal forma que os direitos humanos são cada vez mais
respeitados e as violações desses direitos cada vez menos toleradas.
Os efeitos da revolução pacífica, desarmada, por
meios não violentos se mostram muito mais duráveis, mais efetivos e com muito
menos oposição do que, ao contrário, a da revolução violenta, armada, que provoca
traumas de longa duração, até incuráveis, o que obriga os vitoriosos do dia a eliminar
os membros do antigo regime e possíveis opositores futuros. Mas a história
nos mostra que o germe do ressentimento perdura e se revela tão logo surja oportunidade,
quando o regime revolucionário se desmoraliza e enfraquece, moralmente desgastado
pelo tempo, corrompido pelo poder absoluto, pelas relações interesseiras que se
criam no correr de ditaduras de longa duração. Foi exatamente o que ocorreu na
União Soviética e é por isso que se esfacelou.
A revolução dos costumes provocada pela pílula anticoncepcional,
pelos hippies, o movimento estudantil francês de maio de 1988, os métodos
propostos por Gramsci, Bertolt Brecht e Paulo Freire proporcionam poderoso arsenal de armas culturais que permitem desenvolver revolução pacífica,
praticamente sem traumas, eficaz e de efeitos duradouros.
O humanista não aceita a revolução armada,
violenta, abjetamente genocida.
A revolução armada está ultrapassada. A violência está obsoleta.