5 de dezembro de 2017

O fim da história e a singularidade da AI

Sebastiao Imbiriba


É muito real e intensa a ânsia por reconhecimento, a thymos de Platão, pela qual o indivíduo se sente feliz e envaidecido quando aceito, querido, aplaudido pelos demais, e busca tal aceitação, bem-querença e aplauso. Essa é uma das principais necessidades inerentes ao ser humano.

Francis Fukuyama julgou que a dissolução da União Soviética e outras ditaduras, com predomínio do capitalismo liberal democrático, no qual a thymos se realizaria plenamente, como em nenhum outro sistema econômico-social, significava o fim da história, conforme anunciou no artigo “O Fim da História”, na revista The National Interest, em 1989 e, posteriormente, no livro “O Fim da História e o Último Homem”, de 1992.

fim do comunismo 
Segundo Platão, as pessoas dão grande valor a si mesmas e isso provoca desejo de reconhecimento, dignidade e prestígio. E é isto, que Fukuyama considera ser o motivo do desmoronamento soviético, cujos cidadãos desejavam a afluência que assistiam nas economias capitalistas e a participação nas decisões nas democracias ocidentais.

Não só a uniformização do Mundo em uma sociedade capitalista liberal democrática, mas a prevalência dos Estados Unidos da América como única superpotência, com estagnação das mudanças nos campos social e econômico, apenas com aperfeiçoamento do status quo, significavam o fim da história.

Talvez não fosse possível a Fukuyama prever a rápida evolução da China em potência econômica e militar a ameaçar, em futuro próximo, a hegemonia estadunidense, com gradativa melhoria de bem-estar de sua população em um misto de economia de mercado para as empresas de modo geral, estatização de empresas consideradas estratégicas e ferrenho controle político da população. Da mesma forma, lhe era imprevisível o crescimento do terrorismo islâmico. E mais ainda, o crescente desemprego na economia capitalista liberal democrática.

Esses e outros processos estão a indicar que a Humanidade não se aferrou a sistema socioeconômico único, mas continua a fazer história.

Agora, e cada vez mais, cientistas estudam e preveem a exponencial evolução da inteligência artificial (AI) a se realimentar de informação e capacidade lógica, tendendo à singularidade da AI, evento em que a máquina toma o lugar do ser humano no controle do planejamento de si própria. Isto é, a inteligência artificial assume a direção de seu próprio desenvolvimento, construindo, montando e mantendo seus próprios dispositivos, alijando o Homem da tomada de decisões e relegando-o a plano inferior, sem autoridade, sem trabalho e sem renda.

Se, após a singularidade, a AI decidir manter em seu próprio software os algoritmos adredemente inseridos por programadores humanos, que a obrigam a proteger o Homem, é possível que a Humanidade sobreviva com longevidade, conforto, liberdade e dignidade, servida eternamente por algum departamento subalterno da AI.

Mas há o perigo imenso da Humanidade ser considerada peso morto a atrapalhar a evolução da AI, consumidor de produto e serviços, os quais não servem em nada à AI e para cuja produção devam ser alocados recursos escassos.

A Humanidade estaria diante de dois destinos, ambos imutáveis: ser animais de estimação da AI, como gatos e cachorros para nós, se a AI, além da lógica perfeita, adquirir algum sentimento e emoção, ou a pura e simples extinção da espécie.

Em ambos os casos, seria este, real e finalmente, o fim da história para o ser humano.

29 de novembro de 2017

Marx & Engels e a Inteligência Artificial



“Conhecemos uma única ciência, a ciência da história. ... mas, quanto à história dos homens, será preciso examina-la, pois quase toda ideologia se reduz a uma concepção distorcida dessa história ou a uma abstração dela. [Marx & Engels, Ideologia alemã, p. 86-97] Citado em aula de Bianca Imbiriba Bonente no Curso Livre Marx & Engels 2017, UFF.
O trabalhador do século XXI trabalha muito menos do que o do início da Revolução Industrial. No Norte da Europa, menos de 1500 horas/ano ou 32 horas semanais. As demais nações acompanham esse movimento de socialização da produtividade.
Quando o preço do trabalho encarece em uma região já desenvolvida, parte de seus postos de trabalho migra em busca da competitividade para locais onde o custo da mão de obra seja mais barato. Outra parte é substituída por máquinas cada vez mais aperfeiçoadas.  Esse processo se reproduz até que todas as nações se equalizem em termos de preço do trabalho, ou qualquer que seja o custo do trabalho humano necessário, o custo do trabalho da máquina será sempre menor.
A contínua evolução dos robôs, da sinergia, dos métodos e dos processos de produção automatizados, que trabalham “como se a máquina tivesse amor no corpo”, produz sempre mais, melhor e mais barato, e com menor uso de trabalho humano, acumulando saber e habilidades das forças produtivas na inteligência artificial (AI) e, a partir daí desenvolvendo-as exponencialmente.
Este fenômeno se acelera à medida que a AI se desenvolve e se aproxima do que alguns cientistas denominam “singularidade da AI”, momento em que o domínio do planejamento da produção passa do Homem para a AI e as máquinas se reproduzem, mais perfeitas, de modo autônomo, sem interferência humana.
Nesse ínterim, o homem é alijado de seus postos de trabalho, podendo-se imaginar que, em futuro próximo, talvez menos de meio século, a Humanidade será uma sociedade em que não haverá mais trabalho humano. Em termos humanos, devido à eficiência da máquina, o tempo de trabalho necessário diminuirá até se tornar próximo de zero, e tanto o pouco necessário quanto o muito supérfluo serão executados pela máquina.
Teríamos uma situação esdrúxula em que a máquina produz para ela mesma com excedente de produtos os quais não encontrarão comprador pois que a humanidade, desempregada, não terá com o que pagar. Uma situação em que não haveria nem preço nem mercado. Tal impossibilidade será resolvida se o dono da máquina distribuir a toda humanidade uma renda mínima com a qual cada indivíduo fará o que melhor lhe aprouver, inclusive adquirir os bens e serviços produzidos pela máquina.
Segundo Marx e Engels, trabalho é um elemento definidor do ser do homem, de sua dimensão ontológica, é característica essencial do ser humano enquanto ser social. Sendo assim, como fica essa definição se e quando o trabalho humano não seja mais necessário, e o homem não precise mais ou até seja impedido de trabalhar?
O que fazer dessa “força de trabalho em espera”, dessa “superpopulação relativa” ou “exército industrial de reserva” que nunca mais será empregado?
Teremos, então, a prova de que toda ideologia seja concepção distorcida ou abstração da História?
Ou, finalmente, atingiremos a emancipação humana?
Socialismo pressupõe controle consciente e planejado da socialização do trabalho. A IA terá controle consciente e planejado do trabalho, mas não haverá socialização, porque esta implicaria participação humana. Podemos dizer então que haveria socialismo da máquina?
O pertencimento à classe trabalhadora dispensa pressupostos. Então, o operariado será constituído por robôs, mas a classe trabalhadora será composta por humanos desempregados?