Permitir o exercício da atividade jornalística apenas a bacharéis em jornalismo seria conceder a eles exclusivo privilégio de informar todo o resto da sociedade e impedir outros cidadãos de exercer o direito de difundir suas idéias e de informar o público de acordo com suas próprias éticas, óticas e interpretações.
Em decisão por oito votos favoráveis ao parecer do relator e um voto contra, estando ausentes dois ministros, o Supremo Tribunal Federal declarou inconstitucional a exigência de diploma universitário para exercício da profissão de jornalista. O relator, ministro Gilmar Mendes, defendeu a tese da íntima e indissolúvel vinculação deste tipo de atividade com o preceito constitucional de amplo exercício da liberdade de expressão e informação.
A este ponto fundamental, o da constitucionalidade do privilégio, acresce o do interesse público quanto à regulamentação das profissões. Todas as atividades estão, de modo geral, devidamente regulamentadas pelos Códigos, principalmente o Civil e o Penal. Mas, devido a seus inerentes e relevantes riscos à sociedade e a pacientes ou clientes, há necessidade de normas complementares quanto à capacitação e habilitação para exercício de determinadas atividades. Caso, por exemplo, da condução de veículos. Estão incluídas neste rol: medicina e engenharia.
A excessiva regulamentação profissional, no entanto, tende a formar reservas de mercado estamentárias, estabelecer privilégios indevidos, excluir pessoas altamente capacitadas e talentosas, e emperrar a sociedade nestes tempos que requerem grande dinamismo e flexibilidade. Estão neste caso, entre muitas outras, as atividades de músico, cantor, ator, artista plástico, escritor, costureiro, rendeiro, poeta, apresentador, historiador, jornalista e, é claro, como disse o ministro Gilmar Mendes, chefe de cozinha.
Isto não significa diminuir a absoluta importância do conhecimento, nem que uma das melhores formas de obtê-lo seja por meio do estudo formal, embora o domínio da técnica se adquira na prática, donde a necessidades de estágios. O mundo de hoje permite ao interessado adquirir tanta ou mais informação, conhecimento e formação na Internet do que em muito curso "pague-e-passe" de alguma academia barata.
Regulamentação é coisa importante demais, séria de mais para ser banalizada. A atual crise financeira internacional nos mostra onde ela é, de fato, necessária. O salto de eficiência de sociedades que desregulam nos aponta onde ela é elitista e prejudicial exatamente contra os mais carentes. O corporativismo medieval é deslocado e anacrônico. Para cada posto de trabalho perdido em país excessivamente regulamentado, muitos empregos são criados onde a regulamentação é menor. Mesmo com a crise, os índices de emprego são piores na Europa do que nos Estados Unidos; para saber a razão basta perguntar onde as relações trabalhistas são "melhor" regulamentadas.
A desregulamentação areja e dinamiza a sociedade. Mais do que, simplesmente, liberalizar o exercício do jornalismo, a sociedade precisa atenuar, e muitas vezes eliminar, o gesso imobilizador da excessiva, indevida e muitas vezes odiosa regulamentação profissional.
Ao observador isento parece que muitos dos que protestam tão veementemente contra a decisão do STF focam muito mais as próprias conveniências contrariadas do que o interesse público, o que seja melhor para o conjunto da sociedade.